"Não desidrates a alma, ó palerma!"

(isto vai ser uma coisa quase poética… a sério)


Na banheira, chorava sozinha.

Coitadinha.

Ela só precisava de um abraço.

Mas não havia espaço.

Tinha o coração preenchido como se tivesse morrido.

Era um enorme vazio que a matava por dias a fio.

E vivia assim a sua vida.

Era uma causa perdida.

Mas depois achou-se.

Lembrou-se.

Mas que merda é esta?!

A vida é uma festa!

Então, saiu da banheira.

A diversão tinha fila e ela queria ser a primeira.

Que se fodam os arrependimentos.

A memória não existe apenas para os piores momentos.

Desejou que quem não a amava fosse levar no cu.

A doer se pudesse ser.

Acordou da estupidez e decidiu-se de vez.

Primeiro eu e depois tu.

E, se achares que não, podes ir para o caralho, então.

Eu vou deixar as lágrimas aqui.

A vida continua e não depende de ti.

Adeus banheira, olá brincadeira!

Tu ficas para o fundo da fila, e eu sou a primeira.


(eu não disse?... eu não disse que isto ia ser quase poético?)

Cão Sarnento.

Pitinha

Contrariamente à crença popular (largamente difundida pelas mulheres e ignobilmente apoiada pelos homens), os gajos não são os únicos com a extraordinária capacidade de fazer migrar o centro de decisão mental do norte para o equador do corpo (sim, sim, a região anatómica entre as pernas). Desenganem-se os dogmáticos e queimem-se os manuais de sexualidade ressequidos, pois o macho não é o único-a-pensar-com-aquilo-que-tem-entre-as-pernas. Cada vez mais, assiste-se a uma mudança de paradigma (sempre quis usar esta palavra aqui, mas nunca tinha surgido a oportunidade). A cada dia que passa, ambos os sexos (sim, sim, ambos) têm mais facilidade em fazer migrar o centro de decisão do norte para o equador. E para quê? Ora, para que toda a acção (não sei se me faço entender) fique mais próxima do sul, que é onde está o quentinho. Para a gente pouco versada nestes assuntos, estou a falar do belo sexo (que não tem de ser sempre belo, propriamente dito e que, na verdade, se for belo, o mais certo é que não preste para nada… isso já é fazer o tal de amor e… bem, isso não é agora para aqui chamado, que não quero criar confusões). Onde quero chegar com isto? Bem… quero apenas deixar aqui o meu sincero agradecimento à mudança dos tempos.

Cão Sarnento.

"Kiss my ass"


Lambe-me a pele e diz-me que sabe a mel. Se não gostares de tanto doce, diz-me que sabe àquilo que gostarias que fosse. Se, mesmo assim, não gostares de mim, diz-me se o sabor que a tua língua quer pode ser gosto a mulher. Esse é um sabor que tens de gostar. Já comeste depois de provar. Se esse sabor não te convencer, só há uma coisa a fazer. Dás-me um beijo. Depois, logo vejo. Beija-me aqui, ao fundo das costas. Eu já senti e sei que gostas. Anda cá. Anda beijar a menina má.


(às vezes, os gajos têm de ser secretamente gajas… é que, para saber o que uma gaja quer, é preciso ser mulher; ou, então, é preciso ser Cão… ahah)

Cão Sarnento.

O começo do fim

A cobra é que tem a culpa. Tudo o resto são apenas pequenos delitos que se diluem em mitos e se resolvem com uma multa. Ninguém é responsável pelos seus actos. Somos todos imbecis. Sou eu quem o diz. Somos patos. É verdade, não é só má publicidade. Vá, ouçam lá. Fiquem à escuta. A culpa é dessa filha da puta. A cobra. Foi ela que arruinou a obra. O plano era bom, mas a sabotagem foi melhor. O homem tornou-se cão, e a sua vontade tornou-se a do Senhor. E a mulher? Ora, essa faz o que quer. Sempre fez e há-de fazer. Qualquer outra afirmação é apenas mentira de quem não quer ver. Difícil de acreditar? Nem por isso. Se pararem para pensar, o homem é o sexo submisso. Enlouqueci de vez? Talvez. Mas chamem-me louco. Não é coisa de que me importe. É uma sorte. Até rio e faço pouco. Olhem o coitadinho do tolinho, que já não sabe o que diz. “Coitadinho” o caralho que te foda, a ti, e à tua família toda (só para pôr os pontos nos is). Isto não é insulto gratuito. É só uma achega para quem se faz de esquisito. Até ver, a foda toca a todos para nascer (os que nascem em laboratório são cantiga de outro repertório). Acham que falar mal é dizer “caralho, vai-te foder”? Falar mal é não saber o que dizer das ideias erradas que nos ensinam quando estamos a crescer. Isso é que é uma foda que nunca sai de moda. Somos ensinados a ser pobres e a trabalhar por uns cobres. Mas a culpa é da puta da cobra, que nos dá raiva que até sobra. E a mulher? Outra vez? Caralho, não vês? Essa faz o que quer.
Olha que não, olha que não!, diz o homem em geral.
Ai, não?, pergunto eu, já a vê-lo mal.
Não!, responde o gajo armado em carapau.
Tu cala-te mas é, seu cão!, aviso eu, já para lá de mau. Ai não gostas que te fale assim? Então, desiste da tua estupidez em vez de, a cada dia, lhe juntares mais uma prova. Arranja uma desculpa nova. Deixa de culpar a cobra. Vai por mim. Admite que a responsabilidade é tua do início até ao fim. Sê homem e admite que és cão. Conhece-te a ti mesmo, que essa é a solução. Mas, então, e a mulher? Caralho, pela última vez caralho, já disse que essa faz o que quer!

Cão Sarnento.

O pé da cereja


Ao querer sobrepõe-se a inveja.
É assim que se atormenta
Quem tem menos do que deseja.

Tudo o que vai para além do que se tem
Não devia pertencer a mais ninguém.
É ponta de língua na pimenta.

Pica de um jeito que ninguém explica.
Pica e incomoda.
É uma foda.

Mas não é uma foda das melhores.
É a foda da moda
Que sujeita as pessoas a horrores.

Isto de invejas
É como as cerejas.
A primeira que se come apenas dá mais fome.

E o corpo quer.
Seja homem ou mulher.
Quer a cereja da inveja.

Pega-lhe pelo pé
Só para ver como é.
Comeu-se.

Depois de lhe pegar
O difícil é parar.
Fodeu-se.

Cão Sarnento.

"Morde-me a boca"


O sexo é só foder ou também é amor sem saber? Alguém sabe? Alguém quer saber? Não interessa. Essa é que é essa (não gosto desta expressão… só a usei para rimar). Seja como for, o sexo vai além do corpo e do calor. Mas e quando o corpo já não interessa e se acaba o calor? O que é que fica na cama? O que resta da chama? Palavras. Coisas cruas e sem sabor. O que for. Apenas duas pessoas que se comeram com a vontade de saborear coisas boas. Só isso. Tudo o resto levou sumiço (é, as rimas são todas propositadas). E quando tudo se vai, e ficam só as palavras, as palavras já não são palavras, são mentiras. Coisas que não se pensam nem se sentem, mas que se dizem apenas porque são giras. Grande merda. Antes de chegar a essa situação, mais valia as pessoas dizerem “já não tenho tesão”. Não seria grande perda. O que interessava não perder já tinha ido. E levou consigo a honestidade como se ela nunca tivesse existido. Quando o desinteresse ganha lugar e as mentiras começam, mais vale dizer “morde-me a boca com vontade, e faz-me calar se o que eu tiver para te dizer não for verdade”. Talvez aí, nessa dentada, regresse o interesse em menos de nada. Talvez a chama se reacenda como se, aos olhos do desinteresse, a dentada se tornasse uma venda. Depois, acontecia o que tinha de acontecer. Os corpos aproximavam-se e recordavam o sabor um do outro. Ou, então, afastavam-se até esquecer. É a decisão do quente ou frio. Choro ou rio. O morno é uma temperatura desinteressante que leva à apatia do tanto me faz que as coisas sejam boas ou más. Normalmente, é precisamente isso que as pessoas conseguem umas das outras. Morno. A temperatura do casamento sem amor. Da relação sem emoção nem calor. Morno. Uma coisa que deixa a mulher frígida e o homem corno. Se, ao menos, houvesse a coragem para dizer “se não me podes amar, morde-me a boca e faz-me sangrar”.

Cão Sarnento.